Documentário retrata relação de evangélicos com a política

“Eu tô gravando um documentário sobre a relação dos evangélicos com a política. Mas eu precisava de uma família que não tivesse nenhuma relação com a política. Uma família evangélica comum. Aí, como vocês são a minha família e são evangélicos, eu resolvi falar com vocês”. Essas são as palavras de Felipe Neves, diretor do documentário Púlpito e Parlamento: Evangélicos na Política, nos primeiros minutos do filme. Na cena, vemos apenas sua família sentada no sofá de casa, reagindo timidamente à proposta do então estudante de jornalismo preparando seu TCC para se formar na PUC-SP.

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“Desde o início eu já tinha a ideia de traçar uma linha da minha própria casa até o Congresso Nacional”

 

Felipe se interessou em contar essa conturbada história a partir das eleições de 2014, quando tivemos dois evangélicos de perfis bastante diferentes concorrendo à vaga de Presidência da República: Marina Silva e Pastor Everaldo. Não por falta de tentativa, ambos não estão no documentário. São ausências expressivas, mas a densidade do conteúdo apresentado é tão evidente que percebe-se que o assunto exige mais que apenas um filme de 60 minutos.

O jornalista tem 22 anos e bancou do próprio bolso viagens ao Rio de Janeiro e Brasília para documentar seus personagens. “Foi na marra”, afirmou ao catavento*. Morador de Guaianazes, na periferia de São Paulo, Felipe filmou, entrevistou e editou tudo sozinho, contando com a ajuda de alguns poucos colegas no processo.

“Desde o início eu já tinha a ideia de traçar uma linha da minha própria casa até o Congresso Nacional”. O trajeto de Felipe, assim, é de uma câmera 100% pessoal, de olhar neutro na maior parte do tempo. A câmera na mão, direta, percorre corredores de instituições políticas ou eclesiásticas e se encontra com personagens distantes ou muito próximos à essa realidade.

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Estão lá acadêmicos, pastores, pregadores de rua e deputados. Marco Feliciano está lá, mas quase não esteve. Em artigo no Huffpost Brasil, Felipe relata que esperou 4 horas para entrevista-lo, mas teve dificuldade com a má vontade da assessoria e a entrevista oficialmente não aconteceu.

Tal má vontade fica bastante evidente num dos trechos onde o deputado aparece. Tentando se entrosar com o documentarista, Feliciano menciona que tem um amigo professor da PUC, universidade onde Felipe fez seu curso. Em meio a uma conversa até agradável, uma senhora ao lado ironiza o registro do diretor. O deputado pergunta se ele vai gravar sem parar. A senhora ao lado responde:

– Vai, até que o senhor fale uma besteira. Aí ele vai pegar a besteira que o senhor falou e botar no canal da faculdade. Ele tem cara de gente boa, mas não se sabe né? Jornalista é ruim – e termina rindo.

Não deixa de ser irônico, contudo, que a tentativa de insultar o jornalista acabou revelando que Feliciano fala umas besteiras que às vezes viram pauta.

No contraste, o documentário também ouve as falas de Antônio Carlos Costa, da ONG Rio de Paz, o deputado estadual de SP Carlos Bezerra Jr, e a pesquisadora da metodista Dr. Magali Cunha, que teve artigo sobre o neoconservadorismo evangélico publicado no Observatório da Imprensa.

Felipe afirma que, “modéstia à parte”, seu projeto merecia mais visibilidade que apenas ser um TCC. Assistir ao documentário deixa essa relevância bastante evidente, mesmo diante das pequenas limitações técnicas ou das mais expressivas ausências na pauta.

Assim, da simplicidade da família de Felipe em sua relação com a política ou até nos discursos mais acadêmicos, engajados ou partidários, na divergência disso tudo se percebe uma evidência clara: o evangélico brasileiro tem muito o que percorrer até poder falar que está sendo relevante politicamente em nosso país.


Assista ao documentário completo: