"Eu entrei nisso por que eu amo o que faço e eu quero compor tipo de música que componho. Fazer inúmeras concessões não iria valer a pena.”

John Mark McMillan por um ateu

Assistindo a um discurso feito por Dan Barker, advogado porta-voz dos ateus Norte-americanos e um dos vários comentaristas a serem expulsos da Fox News por afirmarem que Deus não existe, o querido guru ateu admitiu que algumas vezes por ano esperava sua esposa e crianças dormirem e saía dirigindo. Ele dirigia até atingir um campo aberto. Sendo um ex-pastor, ele pegava um de seus álbuns cristãos favoritos e cantava louvores para o céu noturno. Não que ele ainda enxergasse algum significado nisso, é que existe uma espécie de êxtase que só vem de uma boa música cristã. Isso aqui é sobre essa sensação.

Agora, eu não quero chatear todos vocês com minha história com Deus – digamos apenas que eu e ele estávamos em um relacionamento sério e, após passar um doloroso término, permanecemos felizes separados. Mas eu sabia completamente o que Baker estava falando porque eu, ateu tão convicto quanto ele, faço a mesma coisa.

“Suas letras sempre tiveram um pouco mais de profundidade, sem falar na ousadia, que a maioria dos cristãos no topo das paradas”

Uma das músicas que eu tendo a ouvir para isso é escrita por John Mark McMillan. Se você está acostumado com o universo cristão, você provavelmente conhece. McMillan é famoso (mais ou menos) por ter cantado “How He Loves”, que é tipo a “Amazing Grace” dessa geração. Foi regravada milhares de vezes, cantada milhões de vezes nas igrejas e todo mundo pensa que The David Crowder Band a escreveu, por que é assim que a música cristã funciona. Claro, faz sentido que a indústria da música cristã não se dê bem com McMillan. As raízes dele sempre se aprofundaram mais na tradição do “southern rock” do que em The Newsboys e suas letras sempre tiveram um pouco mais de profundidade, sem falar na ousadia, que a maioria dos cristãos no topo das paradas. Sua música ainda assim sofreu com as deficiências do rock cristão, mas havia sinceridade e legitimidade suficientes em tudo para tornar tais imperfeições mais brandas.

No entanto, eu nunca esperei que ele lançasse um álbum como “Borderlands”.

Veja só, eu não estou tentando “te vender” esse álbum por que é ótimo pros dados demográficos da “Sputnik Music”*. Não é. Essa música não é “cristã-sensível”. Isso não é “As Cities Burn” ou “Me Without You”. Ninguém vai comentar “é, ela fala sobre Deus, mas não querendo te convencer”. Não, essa música foi escrita com igrejas evangélicas em mente, tem uma tonelada gritante de amor de Jesus aqui. A razão que eu estou tentando lhe convencer desse disco é que, apesar de ser inteiramente cristão, também é um dos mais criativos e revigorantes que já ouvi. Facilmente fica entre os melhores álbuns cristãos que possuo e continua entre os maiores álbuns lançados em 2014.

mcmillan paisagem

“Apesar de ser inteiramente cristão, também é um dos mais criativos e revigorantes discos que já ouvi”

Caso em questão: faixa nove, “Silver Shore”. Após um começo à la “Phil Collins”, entram dois minutos de tambores e um coral explode para a superfície. Eu não estou falando de um coro de “garotos-católicos-empoeirados”, estou falando de um coral de “Afrodescendentes-estou-cheio-do-Espírito-Santo-e-vou-cantar-sobre-isso”. É positivamente emocionante e tem suas raízes entre as melhores partes da tradição cristã. Eu não acho que algum de vocês vai passar por ela e não se pegar pensando “Puta merda, eu realmente pertenço à costa prateada do Paraíso*.” (N.T.: Silver Shore significa costa – litoral – prateada)

Ou pegue a faixa seguinte, peça central do álbum, “Heart Runs”. Começa como uma adoração cristã feita do jeito certo. Versos não-tão-enjoativos, um respeitoso e crescente refrão e de repente, na ponte, uma corneta explode do nada e toda a dinâmica muda. Puro êxtase religioso.

A razão de Borderland ser tão incrivelmente bom é por que ele traz a música cristã para os mesmos padrões e qualidade da música secular. Ele não precisa ser avaliado em uma curva, não precisa dar um desconto por ser cristão e, mais importante, não está pedindo isso a você. O som é respeitoso aos anos oitenta, mas na mesma proporção em que reverencia também inova. As composições mudam sem parar e de maneira inventiva e juntam-se de maneira inesperada para criar cenários legitimamente empolgantes. A música título “Borderland”, por exemplo, deve ter uns três instrumentos diferentes de percussão.

“‘Future/Past’ está lá pra compensar, mas é uma das mais bem compostas em anos”

Ainda mais que isso, quase toda canção aqui tem esses momentos. Momentos que fazem pessoas como Dan Barker e eu continuarem a entoar louvores a alguém que estamos bem certos de que não existe. McMillan tem seu rabo preso: a canção de adoração genérica “Future/Past” está lá pra compensar, mas é uma das mais bem compostas em anos. Tanto é que nossos pobres ouvintes de 15 anos e leitores do “sputnik” que ainda são arrastados para a igreja por seus pais, provavelmente irão ouvir essa música todo domingo por que o universo cristão irá devorá-la. Mas há outras como “Monsters Talk”, que alterna entre quatro melodias distintas, não possui refrão e termina com uma peça estendida de um rock instrumental dos anos 80. Não há nada no rock cristão como isso.

Apenas dê a esse disco três ouvidas. Isso é tudo que peço. Talvez meu coração ainda esteja secretamente ardendo por Jesus e eu elevei este álbum cristão alto demais. É uma possibilidade legítima. Eu acho que é mais provável, entretanto, que dentre as três ouvidas, este álbum irá estalar e a maioria de vocês estará naquele campo comigo e Dan Barker. Por que, no fim do dia, música é sobre alcançar aqueles sentimentos e esse álbum traz uma pancada deles.


Traduzido por Daniel Serrano

[* Nota do *catavento: o artigo foi livremente traduzido do review publicado no site Sputnick Music. O texto buscou seguir ao máximo o estilo do autor, incluindo as expressões coloquiais]